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A Organização das Nações Unidas (ONU) anunciou, na última semana (19/11), o estabelecimento de um painel de alto nível sobre tecnologia de inovação e acesso à saúde. Segundo o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, a proposta é encontrar novas estratégias que ofereçam qualidade de tratamento a custos acessíveis para todos, um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) – conheça os 17 ODS estabelecidos em agosto de 2015 na Cúpula das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável. Um grupo de 15 especialistas foi selecionado para compor o painel. O vice-presidente de Produção e Inovação em Saúde da Fiocruz, Jorge Bermudez, foi um dos dois brasileiros escolhidos (junto de Celso Amorim, ex-ministro das Relações Exteriores).
“Considero um convite do secretário-geral Ban Ki-moon uma convocação para o trabalho e ação imediata. Trata-se da oportunidade de discutir as barreiras ao acesso a medicamentos e tecnologias, com o intuito de superá-las e assegurar acesso e acessibilidade universais a todas as nossas populações”, destacou Bermudez. “Vamos discutir a possibilidade de gerar um equilíbrio entre a inovação, necessária para a Pesquisa e Desenvolvimento gerando o lançamento de novos produtos e o acesso aos mesmos, em compromisso com a Saúde Pública e Saúde Global”.
Para o vice-presidente da Fiocruz, o fato de o painel ser coordenado no nível mais elevado das Nações Unidas eleva o patamar sua importância e, ao mesmo tempo, aumenta a responsabilidade dos especialistas. “O assunto do acesso a medicamentos e tecnologias, incluindo diagnósticos, medicamentos e vacinas, vai da esfera da Saúde para a mais alta responsabilidade entre nossas nações. É também uma questão de direitos humanos, como discutido nos mais variados foros mundiais”, afirmou. “Hoje, a migração dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, em especial a Meta 3 [Boa Saúde e Bem-estar], deve nortear nossas ações pela melhoria das condições de saúde e de vida de nossas populações”.
Formado por especialistas com profundo conhecimento na área de inovação em saúde, o painel foi criado com o objetivo de oferecer um panorama sobre temas relacionados a saúde pública, comércio, direitos humanos e questões legais associadas ao acesso a tratamentos. O painel também buscará incentivar novas formas de tratamento que beneficiem, principalmente, as populações mais pobres através do desenvolvimento de vacinas, remédios, diagnósticos e outras inovações que atendam a este público. De acordo com parecer da ONU, estas pesquisas são guiadas, atualmente, pelo aspecto financeiro, excluindo soluções que atendam às comunidades mais vulneráveis e marginalizadas. A crise do ebola, que deixou mais de 11 mil mortos e um estado de emergência mundial, teria servido como um claro exemplo da necessidade de mudar essa perspectiva.
“Nos últimos quase vinte anos vem sendo discutidas as relações entre Comércio e Saúde, no âmbito da Organização Mundial da Saúde e extrapolando para outros foros mundiais. Esse binômio confronta interesses comerciais e interesses da saúde pública. Quando o Brasil e os demais países do mundo assinaram o Acordo Trips em 1994, encerrando dez anos de discussões na denominada Rodada Uruguai no âmbito do Acordo Geral e Tarifas e Comércio (GATT) e criando a Organização Mundial do Comércio, os países assumiram a responsabilidade em implementar este acordo, mas também assinaram o direito de lançar mão das flexibilidades ou salvaguardas”, esclareceu Bermudez. “Exemplos recentes de soluções implementadas no Brasil incluem a produção oficial, as compras centralizadas, o fortalecimento do denominado Complexo Econômico e Industrial do Brasil, os processos e negociações de preços, inicialmente com os antiretrovirais e mais recentemente com outros produtos, além da licença compulsória emitida em 2007. Adicionalmente, o Brasil tem participado em discussões e negociações de âmbito regional”.
O novo painel da ONU sobre tecnologia de inovação e acesso à saúde será copresidido pela ex-presidente da Suíça, Ruth Dreifuss, e o ex-presidente de Botsuana, Festus Mogae. A primeira reunião do painel acontecerá em dezembro de 2015. As recomendações resultantes dos encontros do grupo serão apresentadas ao secretário-geral em junho de 2016.
Jorge Bermudez
Médico e doutor em Saúde Pública, Jorge Antonio Zepeda Bermudez assumiu a Vice-Presidência de Produção e Inovação em Saúde (VPPIS/Fiocruz) em 2011, após deixar a diretoria da Unitaid (agência internacional de compra de medicamentos para países em desenvolvimento), cargo que exerceu de 2007 a 2011. Antes, de 2004 a 2007, chefiou a Unidade de Medicamentos, Vacinas e Tecnologias em Saúde da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/OMS) para a região das Américas.
Graduado em Medicina pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em 1971 e mestre em Doenças infecciosas e parasitárias em 1976, também pela UFRJ, Bermudez foi diretor de Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos/Fiocruz), 1985-1987, presidente do Instituto Vital Brazil e da Associação dos Laboratórios Farmacêuticos do Brasil (Alfob) (1987-1991 e de 1999 a 2001) e secretário executivo adjunto do Ministério da Saúde (1993).
Na academia, Bermudez concluiu o doutorado em Saúde Pública em 1995, pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/ Fiocruz), da qual foi diretor entre 2001 e 2004, coordenador de pesquisa de 1997 a 1998 e é, atualmente, pesquisador-titular. O gestor tem diversos artigos, livros e capítulos de livros publicados sobre saúde pública, políticas farmacêuticas, acesso a medicamentos e propriedade intelectual, áreas em que também orienta mestrandos e doutorandos.
A experiência de Bermudez na Fundação Oswaldo Cruz contribuirá para sua participação no painel. “A Fiocruz é a maior instituição de ciência, tecnologia e inovação na América Latina e uma das maiores do mundo, com acordos de cooperação com as maiores instituições em todos os continentes. Além disso, temos atividades de pesquisa, desenvolvimento e produção. Somos parte do Ministério da Saúde [MS] e participamos na implementação de atividades guiadas por diretrizes do MS, inseridas nas prioridades do Governo Federal e do Sistema Único de Saúde”, esclareceu o vice-presidente. “Toda a discussão gerada pelo movimento da Reforma Sanitária e o capítulo de Saúde da nossa Constituição Federal em 1988 (Saúde como direito de todos e dever do Estado) podem ser modelos que ajudam na discussão de como eliminar as barreiras e promover o acesso de nossas populações às tecnologias necessárias e nos ajudar na definição de populações negligenciadas em lugar de doenças negligenciadas”.
Fonte: Agência Fiocruz de Notícias (AFN)*
*Com informações da Organização das Nações Unidas (ONU).