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Artigo do colaborador da Fiocruz Brasília/UNASUS, Claudio Maierovitch, publicado no jornal Correio Braziliense.
Claudio Maierovitch Pessanha Henriques – Mestre em medicina preventiva e social, especialista em medicina tropical, ex-diretor de incorporação de tecnologias e de vigilância das doenças transmissíveis do Ministério da Saúde
A 71ª Assembleia Geral da ONU incluiu o compromisso dos países membros com esforços para enfrentar a resistência de agentes infecciosos a medicamentos antimicrobianos. Estimativas conservadoras indicam quase 500 mil mortes anuais no mundo em consequência de infecções por organismos multirresistentes. Há estudos nos EUA indicando custo anual de US$ 55 bilhões por ano naquele país, sendo US$ 20 bilhões gastos diretamente com serviços de saúde. Algumas projeções indicam que, seguindo a tendência atual, a resistência a antimicrobianos (RAM) comprometerá recursos crescentes, devendo alcançar de 2% a 3,5% do PIB mundial em 2050. Em contraste, a falta de investimentos é bem ilustrada pela informação de que as classes mais modernas de antibióticos têm 30 anos. Em geral, há pouco interesse da indústria, pois a maioria desses tratamentos dura poucos dias e não gera grande receita.
A prioridade do tema, bandeira empunhada pela diretora geral da OMS, Margareth Chan, foi ofuscada por três emergências de saúde pública internacionais: em 2014, o crescimento de casos de poliomielite e a epidemia causada pelo vírus ebola; em 2016, a epidemia causada pelo vírus zika, associada a microcefalias. Ainda assim, o plano global sobre RAM foi aprovado pela Assembleia Mundial de Saúde em 2015, e agora teve seu espectro de compromissos ampliado para muito além da área da saúde. O Brasil esteve presente na preparação desse trabalho desde o primeiro momento. Representei o país na reunião de ministros da Saúde e da Agricultura que aconteceu em Haia, em 2014, na qual pactuamos uma agenda que incluiu a realização de uma das etapas preparatórias em Brasília, no final daquele ano.
Por aqui, diversos passos foram dados nos últimos anos. O Programa Nacional de Imunizações cobre todo o país e inclui algumas vacinas capazes de prevenir infecções bacterianas. Além de programas robustos de monitoramento de resistência aos medicamentos utilizados para tratar malária, Aids e tuberculose, desde 2010 a venda de antibióticos no varejo é controlada por receita médica especial. Existem, por determinação legal, comissões de controle de infecção em serviços de saúde e desenvolvem-se também programas de monitoramento de infecções causadas por bactérias multirresistentes. Além disso, há alguns regulamentos sobre os produtos antimicrobianos que podem ser utilizados na criação de animais.
Está dada a oportunidade política de acelerar nossos programas. É importantíssimo que estejamos ao lado daqueles 25 países que já divulgaram seus planos de ação. Tal documento envolve tarefas complexas no campo regulatório, científico e de comunicação. Vários países elaboraram projetos para banir o uso de antibiótico para acelerar o crescimento de bovinos, suínos e aves; no Brasil, que é grande produtor e exportador desses animais, é praticamente impossível saber quanto e como se utiliza. Da mesma forma, pouco vem a público sobre os medicamentos usados em plantações e na aquicultura.
Investimentos óbvios em prevenção precisam ser acelerados. O maior destaque é o saneamento básico, cuja carência ainda é causa de muitas infecções. A adoção de boas práticas de prevenção nos serviços de saúde, em particular a higienização frequente e cuidadosa das mãos pelos profissionais de saúde, é necessidade óbvia e de custo insignificante; significa, por incrível que pareça, mudança na cultura de muitas instituições assistenciais. Ainda são insuficientes os mecanismos de captação e difusão de informações sobre resistência dos microrganismos que afetam nossa população. Tais dados são preciosos para orientar a prevenção e o tratamento adequado das infecções. Por fim, por menos que se acredite na pujança da ciência no hemisfério Sul, temos por aqui competentes cientistas e um sistema de saúde universal, situação favorável para o desenvolvimento de pesquisas clínicas e tecnologias para prevenção, diagnóstico e tratamento, campo em que o Brasil pode dar importante contribuição.
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