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Coordenador do Centro de Relações Internacionais em Saúde (Cris/Fiocruz), Paulo Buss, ministrou a aula inaugural da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz)
“O objetivo abrangente de saúde deve maximizar vidas saudáveis em todos os estágios da vida. E aí começa o grande confronto com quem diz que a cobertura universal deveria ser objetivo do desenvolvimento sustentável”. O tom crítico da fala do coordenador do Centro de Relações Internacionais em Saúde (Cris/Fiocruz), Paulo Buss, durante a aula inaugural da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), na quarta-feira (3/4), foi direcionado aos que defendem que apenas a cobertura universal deve orientar a saúde na Agenda de Desenvolvimento pós-2015. Ele, que convocou estudantes, pesquisadores, professores e toda a comunidade Fiocruz para a defesa de um sistema de saúde universal, equitativo, integral e de qualidade, revelou que a Fundação pode se associar à Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável como um centro de apoio.
Com o tema Saúde na Agenda do Desenvolvimento pós-2015: desafios nacionais e globais, o ex-presidente da Fiocruz esmiuçou o documento resultante da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (CNUDS), a Rio+20, intitulado O futuro que queremos. Além disso, defendeu que não se assegura desenvolvimento sustentável sem a garantia de uma população saudável. “Temos presente, na nossa visão de sociedade, que saúde e desenvolvimento estão conectados. Uma população mais saudável contribuirá para o desenvolvimento, da mesma forma que populações menos saudáveis terão dificuldade em crescer economicamente e progredir. Sem a preocupação com a saúde, o desenvolvimento será pífio. Não terá sentido se não contribuir para o bem-estar, qualidade de vida e saúde”, afirmou Buss, exemplificando algumas das diversas evidências sobre a relação entre os campos.
Conforme mencionado pelo palestrante, o relatório oficial da Rio+20 inclui a dimensão da saúde como um importante componente. A declaração reconhece que “a saúde é uma precondição para, um resultado de, e um indicador de todas as três dimensões (econômica, ambiental e social) do desenvolvimento sustentável”. O documento traz nove parágrafos sobre o tema e, segundo Buss, será um orientador do processo de elaboração da Agenda de Desenvolvimento das Nações Unidas pós-2015, pois reconhece a importância de estabelecer Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs), que devem ser coerentes e integrados à agenda.
Para embasar a construção da Agenda de Desenvolvimento pós-2015, foi criado, em julho de 2012, pelo secretário-geral das Nações Unidas, um Painel de Alto Nível na intenção de assessorar o estabelecimento de um marco de referência à sua construção. De acordo com Buss, o painel apresentará seu relatório ao secretário-geral em setembro de 2013. O intuito é avaliar o progresso com relação aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs) e discutir as opções para o pós-2015. As 11 consultas temáticas são as seguintes: desigualdades, governança, saúde, sustentabilidade ambiental, dinâmica populacional, água, crescimento e desenvolvimento, conflito e fragilidade, segurança alimentar e nutricional, educação e energia.
No caso da consulta para a saúde, o processo está sendo liderado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), em colaboração com os governos da Suécia e de Botsuana. Os objetivos dessa consulta temática são três: avaliar os avanços e as lições aprendidas com os ODMs relacionados com saúde; discutir o posicionamento da saúde no marco de referência para a Agenda de Desenvolvimento pós-2015; e propor objetivos e metas de saúde para essa agenda, incluindo recomendações para sua implementação, medida e monitoramento.
“Brasil deve defender os princípios que nortearam seu sistema de saúde”
Na opinião de Paulo Buss, um primeiro rascunho do que será apresentado às Nações Unidas afirma que a nova Agenda do Desenvolvimento pós-2015 deve abordar relações globais de poder e temas econômicos com impacto sobre pobreza, inequidades e situação de saúde, incluindo os acordos globais de comércio. “Esse é um ponto extremamente importante”, disse ele. “O documento a ser apresentado aponta que saímos do discurso de ilusão. Queremos saber como as questões de comércio global influenciarão a saúde. É uma discussão que perdeu a ingenuidade”, admitiu.
A Fiocruz tem participação na construção do documento da saúde. Como afirmou o conferencista, o princípio orientador dessa agenda busca o bem-estar para todos, com a contribuição de todos os setores e alvos de saúde concretos, relacionados com todos os demais objetivos de desenvolvimento. “O objetivo abrangente de saúde é maximizar vidas saudáveis em todos os seus estágios. A cobertura universal, assim, é apenas um elemento que contribuirá para isso”, disse o palestrante.
Ainda segundo Buss, o Brasil deve ter a posição de defesa dos princípios norteadores da construção do seu sistema de saúde. “A OMS e alguns outros agentes defendem que o objetivo que norteia o desenvolvimento sustentável deve ser a cobertura universal em saúde, e não a cobertura equitativa, integral e outras que fazem parte do nosso conceito de sistema de saúde. Temos um mandato constitucional do que deve ser a ação brasileira. Só o conceito de cobertura universal não serve. Apenas quem quer fazer da saúde um negócio vai defendê-lo. Precisamos manter a postura crítica desta casa. O SUS é um sistema de apenas 25 anos, subfinanciado e, quanto mais estiver assim, melhor será para os que querem fazer negócio com a saúde, inclusive no campo internacional, e que tentam buscar sustentação nesse conceito de cobertura universal. Peço que vocês comprem essa briga e participem dela conosco”.
Uma escola para a ciência, a saúde e a cidadania
Participaram da mesa de abertura o diretor da Ensp, Antônio Ivo de Carvalho; a vice-presidente de Ensino, Informação e Comunicação da Fiocruz, Nísia Trindade; e o vice-coordenador da Associação dos Pós-Graduandos da Fiocruz, David Soeiro. O diretor da Ensp abriu a mesa e destacou a renovação e a oportunidade de troca de conhecimentos proporcionadas pela entrada dos novos alunos na Escola a cada ano.
Carvalho qualificou a Ensp como uma escola voltada para a ciência, a saúde e a cidadania, com uma agenda de atividades, cursos e debates que abarca esses três campos. Como exemplos do trabalho e da importância da Ensp, o diretor citou a participação da escola na construção de políticas públicas para o país e a presença, na instituição, de ministros de Estado e figuras nacionais influentes. Além disso, lembrou o avanço da comunicação, destacando seu papel na disseminação de informação para a sociedade.
Fonte: Informe Ensp.