A interferência da indústria do tabaco como principal obstáculo para adoção de políticas públicas efetivas e o papel da Convenção-Quadro da OMS para Controle do Tabaco (CQCT/OMS), tratado internacional que dispõe sobre medidas para a redução da epidemia do tabagismo em nível mundial, foram alguns dos temas abordados durante a sessão do IX Ciclo de Debates sobre Bioética, Diplomacia e Saúde Pública, promovido pelo Núcleo de Estudos sobre Bioética e Diplomacia em Saúde (Nethis/Fiocruz Brasília), na quinta-feira, 30 de agosto, na Fiocruz Brasília.
O coordenador do Nethis, José Paranaguá de Santana, iniciou as atividades com uma avaliação sobre a interferência de grandes corporações econômicas na regulação de produtos como tabaco, álcool, agrotóxicos e alimentos ultraprocessados. “É impossível para um país individualmente pensar de forma consistente neste tipo de regulação, porque é um processo que envolve decisões de um conjunto de países, a população mundial e as grandes empresas internacionais”, sustentou.
Para a diretora presidente da ACT Promoção da Saúde (antiga Aliança de Controle do Tabagismo), Paula Johns, em âmbito global, as políticas de regulação desses produtos também sofrem forte influência das grandes corporações. “Todo processo de discussão de doenças crônicas não transmissíveis está fortemente permeável à influência dessas empresas”. Ela defendeu a coerência política nas ações de governo e a adoção de medidas regulatórias do mercado. “Não sei como conseguiremos dar conta dessa equação, em função do poder de mercado se traduzir em poder de política, mas precisamos explorar essa questão”, alertou.
A diretora destacou que o atual contexto brasileiro é bastante crítico não apenas devido aos cortes realizados nas políticas de controle, mas também em razão da convergência inapropriada entre o interesse público e o interesse de empresas privadas. “No conselho da Souza Cruz, por exemplo, tem ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), diplomatas e ainda há uma ligação entre a Souza Cruz e outras empresas”, disse.
CONVENÇÃO-QUADRO – O pesquisador Alberto José de Araújo ressaltou que, apesar dos avanços obtidos com a Convenção-Quadro da OMS para Controle do Tabaco (CQCT/OMS), ainda há uma grande parcela da população brasileira que necessita de atenção. “Temos 18,4 milhões de fumantes que precisam de alguma forma serem alcançados por todas as campanhas”. Segundo ele, de cada oito mortes ocorridas no Brasil, uma é relacionada ao tabagismo.
O pesquisador apontou os custos do tabagismo para a economia brasileira. Em custo direto na saúde, são R$ 39,4 bilhões (8% do orçamento total da saúde) e R$ 56,9 bilhões de custo geral referente ao consumo do tabaco, que leva em consideração, por exemplo, a saída do mercado de trabalho do fumante para tratar de uma doença causada pelo consumo do produto.
De acordo com Araújo, é necessária a atenção constante das autoridades públicas para não permitir a interferência das tabageiras nas políticas de controle do tabaco. “Eles não são nossos parceiros. A Convenção-Quadro é a nossa bíblia. Temos que defendê-la artigo por artigo”.
Com a assinatura do tratado, algumas medidas foram adotadas pelo Brasil, tais como: ambientes livres de tabaco; restrição de publicidade e marketing; rotulagem das embalagens com imagens de advertência; e medidas fiscais, com aumento de preços e impostos.
O CICLO DE DEBATES é promovido pelo Núcleo de Estudos em Bioética e Diplomacia em Saúde (Nethis/Fiocruz Brasília). As atividades deste semestre acompanham os temas do Observatório de Regulação Internacional de Fatores de Risco Associados às Doenças Crônicas Não Transmissíveis, projeto coordenado pelo Núcleo de Estudos. A Organização PanAmerticana da Saúde (Opas) apoia a realização das sessões. Acesse as sessões anteriores aqui.
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Veja abaixo a apresentação de slides dos palestrantes:
Diretora presidente da ACT Promoção da Saúde, Paula Johns.
Pesquisador do Instituto de Doenças do Torax Alberto Araújo.