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O relatório, lançado em dezembro de 2019, possui como objetivo o monitoramento da implementação da Convenção-Quadro de Controle de Tabaco (CQCT) e, mais especificamente, acompanhar a prevalência do consumo de tabaco em pessoas com quinze anos ou mais. As estatísticas foram elaboradas com base nos números enviados por 149 países, que representam 77% dos Estados-membros da Organização das Nações Unidas (ONU) e 94% da população mundial.
A primeira edição do relatório foi lançada em 2015 e considera como plano estratégico o monitoramento das seguintes metas: a) a redução de 30% até 2025 (em relação a 2010) do consumo de tabaco (WHO, 2013); b) fortalecer a implementação da CQCT, conforme indicado no Objetivo 3.a, dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. A Convenção-Quadro foi assinada em 2003 e prevê uma série de mecanismos para a redução do consumo de tabaco em nível internacional (pacote MPOWER), como: monitoramento do consumo, políticas de prevenção, oferecer ajuda para parar de fumar, alertar sobre os perigos do tabaco, cumprir as proibições sobre publicidade, promoção e patrocínio e aumentar imposto sobre o tabaco. Apesar de esse relatório reforçar o compromisso de monitoramento do consumo global de tabaco como uma das ferramentas essenciais para atingir as metas propostas, muitos países ainda não possuem sistemas de monitoramento e vigilância (ex.: na região das Américas, quinze países não possuem dados disponíveis para avaliação detalhada da CQCT (WHO, 2019a; 2019b)), como revela o relatório de 2019.
O terceiro relatório da OMS aponta uma diminuição no consumo de tabaco pela população mundial: em 2010, o consumo era de 33,3% e, em 2015, de 24,9%. Segundo a OMS, a tendência é que esse número chegue a 20,9% em 2025, conforme a figura abaixo. Caso essa tendência seja confirmada, a redução do consumo será de 23,4%. Desse modo, a meta de redução de 30%, em relação a 2010, do número de fumantes no mundo não será atingida. O desafio é maior para a faixa etária de homens entre 45 a 54 anos, porque a prevalência de fumantes nesse estrato ultrapassa 50%.
Figura 1 – Tendência global na prevalência do consumo de tabaco por sexo
O documento também fornece análises por região, por país e outra de acordo com a classificação de renda do Banco Mundial. Os resultados apresentados indicam que a região do sudeste asiático é a que tem a maior prevalência de consumo de tabaco (47%), enquanto que o continente africano conta com 18,5% de fumantes. Das seis regiões analisadas pelo relatório (África, Pacífico, Mediterrâneo, Américas, Europa e Sudeste Asiático), a região das Américas é a única que tem potencial para atingir a meta de 30% na redução do consumo de tabaco. No entanto, é fundamental reconhecer que apenas 13 dos 35 países da região das Américas atingirão essa meta, enquanto apenas um país do sudeste asiático e um do mediterrâneo cumprirão a meta.
O Brasil, segundo o relatório, apresentou redução no número de fumantes. Em 2006, 15,7% dos brasileiros eram fumantes; em 2018, esse número caiu para 9,3%, apresentando uma redução de 40%, atingindo, assim, a meta proposta pela OMS. Ressalta-se que, em novembro de 2019, o Senado brasileiro aprovou um projeto de lei que veda a propaganda de cigarros ou qualquer outro produto fumígeno e o uso de aditivos que confiram sabor e aroma a esses produtos, além de configurar como infração de trânsito o ato de fumar em veículos quando houver passageiros menores de dezoito anos (BRASIL, 2019).
É preciso ressaltar que não foram incluídas no relatório estatísticas sobre a situação epidemiológica do consumo de cigarros eletrônicos. Nos Estados Unidos, por exemplo, mais de duas mil pessoas tiveram algum tipo de doença pulmonar relacionadas ao uso desses dispositivos (CDC, 2020). Não obstante a coleta de dados referente a cigarro eletrônico ter começado em 2013, apenas 42 países possuem dados nacionais representativos disponíveis. Assim, estatísticas sobre o consumo de cigarro eletrônico não foram incluídas no relatório porque, segundo a OMS, ainda não há dados suficientes para estimar seu consumo global.
O dispêndio mundial dos sistemas de saúde para doenças atribuídas ao consumo de tabaco foi estimado, em 2012, em 1.4 trilhões de dólares, equivalente a 1,8% do PIB mundial (Goodchild et al. 2018). Diante desse cenário, é fundamental que os países considerem as recomendações indicadas por organismos internacionais na formulação de suas políticas públicas para conter a epidemia global de doenças crônicas não transmissíveis. Essas recomendações, por sua vez, estão calcadas nos seguintes eixos: comercialização, tributação, construção de capacidades, cooperação, legislação e competência, marketing e propaganda, monitoramento e vigilância, programas e políticas, registro, rótulo e conteúdo.
Apesar de a maioria das recomendações emanadas de organismos internacionais constituírem normas de soft law (não vinculantes), a Convenção-Quadro de Controle de Tabaco possui recomendações vinculantes para os Estados-membros e são diretrizes importantes no enfrentamento da epidemia global de doenças crônicas não transmissíveis, pois o consumo de tabaco é um dos fatores de risco. Além de reconhecer quais recomendações internacionais são internalizadas nos países, é imprescindível identificar, por exemplo, os desafios dessa internalização (ex.: interesses conflitantes entre indústria e saúde pública) e seus elementos catalisadores (ex.: liderança política).
Mais detalhes sobre a regulação internacional de tabaco podem ser encontrados na página do Observatório de Regulação Internacional de Fatores de Risco Associados às Doenças Crônicas Não Transmissíveis.
Referências
BRASIL. Projeto de Lei do Senado nº 769, de 2015. Disponível em: https://bit.ly/2G23jC4
WHO global report on trends in prevalence of tobacco use 2000-2025, third edition. Geneva: World Health Organization; 2019a. Disponível em: https://bit.ly/2RhaeN2
WHO report on the global tobacco epidemic, 2019. Geneva: World Health Organization; 2019b. Disponível em: https://bit.ly/35QZTwF
Global action plan for the prevention and control of noncommunicable diseases 2013-2020. Geneva: World Health Organization; 2013. Disponível em: https://bit.ly/2FReCgl
Goodchild M, Nargis N, Tursan d’Espaignet E. Global economic cost of smoking-attributable diseases. Tobacco Control 2018; 27:58-64.
Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Outbreak of Lung Injury Associated with the Use of E-Cigarette, or Vaping, Products. 2020. Disponível em: https://bit.ly/2tihsbB
Imagem 1: Veja.
Imagem 2 (figura 1) : WHO (2019a)
Autoria: Roberta de Freitas e Tiago Tasca.