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Se, por um lado, o armazenamento de informações pessoais desperta discussões éticas sobre o direito à privacidade; de outro, o uso legal dessas informações em estudos científicos tem revolucionado o alcance das pesquisas e o impacto social de suas respostas. Longe de ser um dilema integralmente equacionado pelos governos, o compartilhamento internacional de boas práticas de governança digital foi uma das recomendações apontadas no debate, realizado em 23 de setembro, para assegurar o bom uso dos dados.
Segundo a pesquisadora do Hospital da Universidade de Montreal Cécile Petitgand, além do investimento massivo em segurança das infraestruturas computacionais, é importante a criação de agências nacionais para coordenar atividades de governança e de avaliação dos sistemas de inteligência artificial, que se alimentam de grandes bases de dados. Petitgand ressaltou a necessidade de diálogo entre as agências e organizações multilaterais, como a Organização Mundial da Saúde (OMS). “Hoje a cooperação internacional existe, mas é insuficiente”, alertou.
Como requisito indispensável para garantir um bom uso dessas ferramentas tecnológicas, a pesquisadora defendeu o fomento de capacidades multidisciplinares para profissionais de saúde que vão trabalhar com grandes volumes de dados e sistemas de inteligência artificial. Um modelo de avaliação para esses dispositivos que garanta a participação social foi destacado por Petitgand, que exortou a interoperabilidade dos dados, como um instrumento valioso para conferir maior representatividade a um conjunto de informações coletadas.
De acordo com o pesquisador da Fiocruz Bahia Maurício Barreto, uma das principais dificuldades para a ciência contemporânea é a governança das grandes bases de dados, sujeitas à má gestão e a ações criminosas de hackers. A respeito desses desafios, o pesquisador evidenciou algumas dimensões legais que buscam assegurar o bom uso dessas informações, como a General Data Protection Regulation (GDPR) – o marco regulatório europeu sobre privacidade e proteção de dados pessoais – e a Lei 13.853/2019 no Brasil, que instituiu Autoridade Nacional de Proteção de Dados. Segundo ele, é provável que novos marcos regulatórios surjam com o passar o tempo, já que essas tecnologias estão em franco desenvolvimento.
Em uma tradução livre, ecossistemas de dados de saúde. A integração de grandes bases de dados, segundo o pesquisador da Fiocruz, vem permitindo o cruzamento de diferentes informações sobre a saúde das populações. E é a partir dessa interoperabilidade de sistemas que os cientistas vêm ganhando melhores condições para conduzirem seus estudos.
Ele explicou que a integração de diferentes bases de dados tem possibilitado a realização de pesquisas mais aprofundadas sobre o impacto das políticas públicas, o monitoramento das desigualdades sociais em saúde e a eficácia das vacinas contra covid-19 no Brasil, por exemplo. E para que esses volumes de dados sejam transformados em conhecimento, de acordo com o Barreto, eles devem ser incorporados em populações bem caracterizadas e representativas.
“A ciência baseada em dados será multidisciplinar, colaborativa e menos competitiva do que a ciência clássica e focada em problemas específicos” – Maurício Barreto, coordenador do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia).
Com relação ao dilema entre o uso legal de dados individuais das populações e um possível risco de dano ao direito de privacidade, Barreto provocou os participantes a refletirem: “o não uso desses dados também traz problemas éticos, porque se evita de conhecer informações importantes. Ao meu ver, o grande desafio de nós pesquisadores é dar sentido ao uso desses dados para encontrar soluções importantes à humanidade”, disse o pesquisador.
Assista aqui à íntegra do debate.
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