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Maio de 2020, a Assembleia Mundial da Saúde reconhece a vacinação contra a Covid-19 como um bem público global¹; 130 dos 194 Estados-membros da Organização Mundial da Saúde (OMS) endossam a tese de que a imunização deveria, por princípio, estar acessível em escala mundial. Mais de um ano depois, em dezembro de 2021, a disparidade entre países ricos e pobres é escabrosa²: enquanto nações como Canadá, França, Finlândia e Japão têm mais de 70% de suas populações totalmente vacinadas, outras nações como Camarões, Congo, Etiópia e Nigéria não alcançam nem 5%.
Além de constatar a desigualdade mundial no caso da cobertura vacinal contra a Covid-19, é importante destacar que essa abominável injustiça advém da paradoxal relação entre o crescimento da riqueza no mundo e o agravamento das desigualdades em saúde. Tal absurdo tem origem na hegemonia dos interesses financeiros e industriais na era da globalização, que relegam para as calendas os interesses da humanidade.
Ressaltar, como vem ocorrendo, em diferentes fóruns internacionais e em praticamente todos os meios de comunicação em todos os países, o surgimento das variantes virais em tempos de pandemias é acaciano, pois é fato reconhecido pela ciência desde longa data (sabemos que já existem mais de 1.660 variantes depositadas no sistema Pango; e que muitas já nem circulam).
O grave é que tal medida, aparentemente bem-intencionada, no sentido de garantir informação de interesse público com a “infodemia de Covid-19”, resulta em ampliação de um tipo de “contágio” – o medo e a ansiedade alimentados pela insuportável sensação coletiva de impotência, que acompanham eventos pandêmicos.
A questão que fica é: por que não se adotam medidas concretas para enfrentar os desafios da desigualdade gerada pelo modelo de desenvolvimento global em vigor? Talvez, a pandemia da Covid-19 servisse como estímulo para esse desiderato, pois vacina para os pobres não é um “favor” dos ricos, de modo a evitar que a contaminação prejudique os próprios ricos. Afinal, vacinação é um direito de todos, anunciado em recomendações aprovadas na criação das Nações Unidas e na Constituição da OMS, desde meados do século passado, a ser assumido em prol de um mundo mais humano e mais justo.
Em 2022, o Nethis irá inaugurar uma nova rodada de seminários do Ciclo de Debates, em que serão discutidas questões fundamentais para abordar de forma multifacetada a antinomia entre desenvolvimento global e desigualdades em saúde, eixo motor dos obstáculos enfrentados pela humanidade para superar a pandemia de Covid-19 e outras pandemias futuras.
1. de Freitas, Roberta; Tasca, Tiago. Saúde e solidariedade na 73ª Assembleia Mundial da Saúde: pré-requisitos para o desenvolvimento. Boletim de Direito Sanitário: caminhos para a efetivação do direito humano à saúde.
2. Our Wolrd in Data. Share of the population fully vaccinated against COVID-19 Dec 8, 2021.
Artigo de Opinião. Assinam:
José Paranaguá de Santana, coordenador do Nethis
André Freire, jornalista
Gerson Penna, pesquisador da Universidade de Brasília e consultor sênior do Nethis
NETHIS - Núcleo de Estudos sobre Bioética e Diplomacia em Saúde
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