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Após duas semanas de intensas negociações, a COP-21 (conferência do clima da ONU) terminou neste sábado em Paris com um acordo histórico, que pela primeira vez envolve quase todos os países do mundo em um esforço para reduzir as emissões de carbono e conter os efeitos do aquecimento global. O ponto central do chamado Acordo de Paris, que valerá a partir de 2020, é a obrigação de participação de todas as nações – e não apenas países ricos – no combate às mudanças climáticas. Ao todo, 195 países membros da Convenção do Clima da ONU e a União Europeia ratificaram o documento.
O objetivo de longo prazo do acordo é manter o aquecimento global “muito abaixo de 2ºC”. Esse é o ponto a partir do qual cientistas afirmam que o planeta estaria condenado a um futuro sem volta de efeitos devastadores, como elevação do nível do mar, eventos climáticos extremos (como secas, tempestades e enchentes) e falta de água e alimentos.
Em referência ambiciosa, comemorada por ambientalistas e países menos desenvolvidos, o texto faz referência a esforços para limitar o aumento da temperatura a 1,5ºC. Também define que os pontos do acordo serão revisados a cada cinco anos, para direcionar o cumprimento da meta de temperatura e dar transparência às ações de cada país.
Sobre a questão do financiamento climático, ou seja, quem irá pagar a conta das ações necessárias para o sucesso do acordo, acertou-se que países desenvolvidos irão bancar US$ 100 bilhões por ano em medidas de combate à mudança do clima e adaptação em países em desenvolvimento. Eventuais injeções adicionais de recursos ficaram para 2025, refletindo a divisão que marcou as discussões sobre o assunto na COP-21.
“Isso representa uma perda para os países em desenvolvimento, que queriam ver uma indicação do financiamento pós-2020 na mesa em Paris. Por outro lado, representa uma perda também para a posição dos desenvolvidos, que ameaçaram na noite de sexta-feira tirar os US$ 100 bilhões da mesa se não conseguissem aumentar a base de doadores para incluir países emergentes”, afirmaram os jornalistas Cláudio Ângelo e Cíntya Feitosa, que acompanharam a conferência pela rede de ONGs brasileira Observatório do Clima.
Acordo ‘híbrido’
Em estrutura planejada para obter apoio dos EUA ao acordo, apenas alguns elementos do documento serão “legalmente vinculantes”, ou seja, terão força de lei internacional como regulamentação da Convenção do Clima da ONU, assinada em 1992 no Rio de Janeiro. Para outros pontos, o cumprimento será voluntário.
Essa foi a saída encontrada diante da constatação de que um acordo com metas obrigatórias de redução de emissões dificilmente seria aprovado pelo Senado dos EUA, que tem maioria republicana e fortes opositores à agenda climática do presidente democrata Barack Obama.
Portanto, o documento não traz menções concretas a metas de redução de emissões por país – praticamente toda essa parte do acordo será voluntária. Cada nação deverá cumprir suas metas nacionais, as chamadas INDCs, que seguem o que cada governo considera viável considerando o cenário social e econômico local.
Embora tenham considerado o acordo histórico, ambientalistas fizeram ressalvas em relação a esse ponto.
“Os cortes de emissões prometidos pelos países agora ainda são totalmente insuficientes, mas o acordo como um todo manda uma forte mensagem a empresários, investidores e cidadãos: a energia agora é limpa e os combustíveis fósseis pertencem ao passado”, disse a cientista Corinne Le Quere, diretora do Centro Tyndall para Pesquisa do Clima, da Inglaterra.
“O texto deixa essencialmente nas mãos de cada país, de forma voluntária, a decisão sobre ampliar as ações de corte de emissões e o financiamento aos países menos desenvolvidos. Isso será viável caso os países mantenham o espírito de engajamento que tornou Paris possível. Mas, se essa vontade falhar, corremos o risco de chegar a 2030 ainda numa trajetória de 3ºC, algo incompatível com a civilização como a conhecemos”, disse Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima.
Papel do Brasil
O Brasil teve protagonismo nas discussões na COP-21, sobretudo como mediador de conversas com países em desenvolvimento reticentes a certos pontos do acordo, como Índia e China. Na reta final da conferência, aderiu à chamada “coalizão da ambição”, grupo de países que atuou nos bastidores por acordo mais ambicioso.
Integram o grupo a União Europeia e países como EUA, México e Colômbia, além de países mais pobres e vulneráveis ao aquecimento global. “É uma iniciativa feita pelas Ilhas Marshall (país ameaçado pela elevação do nível dos oceanos) que mobilizou vários países para que pudéssemos fazer progressos (nas negociações) e ficar abaixo (da elevação da temperatura) de 1,5˚C e trabalharmos juntos”, disse a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, ao explicar a participação.
As últimas horas de conversas – que incluíram três noites seguidas de negociações – representaram o cume de um processo de quatro anos para produzir o primeiro pacto internacional de limitação das emissões de gases estufa.
Na plenária da manhã de sábado da conferência, quando os organizadores apresentaram a proposta final de acordo, o clima era de festa, embora as autoridades tenham insistido na necessidade de aprovação pelo delegados.
O ministro das Relações Exteriores da França, Laurent Fabius, disse que o novo texto representava uma “virada” e apresentava um acordo “diferenciado, justo, durável e legalmente vinculante”.
O presidente da França, François Hollande, afirmou que “o acordo definitivo para o planeta” estava “aqui e agora”. E o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, convocou os diplomatas a “encerrar o trabalho” porque “todo o mundo estava assistindo”.
Fonte: BBC Brasil.