“É preciso ter cuidado. Sob o slogan de salvar vidas, as agendas da diplomacia da saúde global, com atores muito variados e interesses contraditórios, podem levar a obstáculos à saúde”, alertou a professora da Universidade de São Paulo (USP) Deisy Ventura durante o X Ciclo de Debates que abordou o tema “Saúde e Globalização”, em 21 de novembro, no auditório interno da Fiocruz Brasília.
A diplomacia da saúde global não está restrita apenas a acordos entre Estados, mas também à participação de agentes diversos, como por exemplo, a Fundação Bill e Melinda Gates. A Instituição, criada pelo fundador da Microsoft, hoje em dia, é a grande financiadora de ações de cooperação internacional em saúde, segundo o Global Burden of Desease 2018, um estudo que analisa a carga global de doenças.
Duas concepções acerca da evolução da diplomacia da saúde global foram destacadas por Deisy Ventura, que é coordenadora da Programa de Pós-Graduação em Saúde Global e Sustentabilidade da USP.
A primeira diz respeito à medicina social, em que a saúde deve ser abordada sob uma perspectiva integral e não como uma resposta pontual a determinadas doenças.
Nessa corrente, os médicos sanitaristas são considerados agentes de transformação social e as comunidades, que são alvos de programas relacionados à saúde, devem ser ouvidas. É a partir dessa visão que surge o conceito de determinantes sociais da saúde, entendido como os fatores sociais, econômicos, culturais, psicológicos e comportamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde nas populações.
A segunda concepção relacionada à evolução da diplomacia da saúde global direciona-se ao fornecimento de respostas a emergências epidemiológicas, à construção de um sistema internacional de vigilância e à promoção de mercados internacionais de saúde, com a disponibilização de serviços técnicos e hospitalares, bem como de medicamentos.
Nessa visão, a saúde é considerada uma condição para o desenvolvimento econômico. As pessoas precisam ter saúde para estarem inseridas no mercado de trabalho. Para o historiador Marcos Cueto, evidenciado por Deisy Ventura durante os debates, essa é a concepção atual da cobertura universal da saúde.
Iniciado na década de 90, o processo de aprofundamento das relações econômicas, sociais, culturais e políticas entre povos espalhados pelo mundo não trouxe consigo a livre circulação de pessoas, tão pouco a globalização da saúde. Segundo Rivaldo Venâncio, coordenador de Vigilância em Saúde e Laboratórios de Referência da Fiocruz, os avanços tecnológicos conquistados pela humanidade não são usufruídos de maneira igual por todos os povos.
“O que vemos hoje é a globalização da doença. As iniquidades em saúde impedem, por exemplo, que parcela substancial da população mundial tenha acesso às modernas técnicas diagnósticas e terapêuticas”, afirmou o coordenador.
Venâncio destacou que no Brasil as condições de vulnerabilidade social, econômica e sanitária aumentam a vulnerabilidade da população brasileira para certas doenças, como a tuberculose e as arboviroses, doenças provocadas por vírus e transmitidas por mosquitos.
Ciclo de Debates – O Ciclo de Debates é promovido pelo Núcleo de Estudos sobre Bioética e Diplomacia em Saúde (Nethis/Fiocruz Brasília). A representação brasileira da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/OMS) apoia a realização das sessões. Acesse as sessões anteriores aqui.