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Para Cláudio Lorenzo, o país deve criar espaços institucionais bilaterais de discussão para garantir equilíbrio da cooperação internacional em saúde
José Paranaguá (NETHIS) e Cláudio Lorenzo (SBB e UnB). Foto: Cecília Lopes
No último sábado, dia 17, o presidente da Sociedade Brasileira de Bioética (SBB) e coordenador do Programa de Pós-Graduação em Bioética da Universidade de Brasília (UnB), Cláudio Lorenzo, participou da mesa-redonda promovida pelo Núcleo de Estudos sobre Bioética e Diplomacia em Saúde (NETHIS) no 10º Congresso de Saúde Coletiva, o Abrascão, realizado entre 14 e 18 de novembro, em Porto Alegre. Sob o tema Diplomacia em Saúde na Perspectiva Bioética, Lorenzo apontou os desafios para o Brasil na cooperação internacional em saúde.
O presidente da SBB fez um alerta para que o Brasil não repita o mesmo papel dos países colonizadores na condução da cooperação sul-sul – visto que, agora, o Brasil é uma das nações protagonistas neste modelo de cooperação: “o que penso ser responsabilidade do Brasil em relação aos aspectos bioéticos tem a ver não apenas com identificação de demandas em saúde de países com os quais temos laços históricos e linguísticos, mas também com a promoção de espaços institucionais bilaterais de discussão, destinados a conceber os fundamentos filosóficos, morais e políticos que mediarão seus programas de cooperação, e o estabelecimento de critérios que visem orientar a formulação, aprovação, implantação e avaliação desses projetos, bem como o respectivo repasse de investimentos”.
Segundo ele, caso contrário, o risco é “inaugurar novas formas de colonização, ainda que sob o escudo da beneficência em saúde”, apontou. Ele sugeriu que o Brasil investigue os seus núcleos centrais de cultura, busque categorias de organização de pensamento ligado à sua riqueza de estilos de vida e costumes, e dê condições de fazer o mesmo no país com o qual fará a cooperação. “Na cooperação norte-sul há uma busca pela homogeneização das subjetividades, usando para isso uma estratégia de imperialismo moral e estético midiatizado e enraizado em processos educacionais que moldam desejos no colonizado de parecer cada vez mais com o colonizador. Isso deve ser evitado na cooperação sul-sul”, afirmou.
Para Lorenzo, a medida que o Brasil avança economicamente, a ponto de planejar e executar a cooperação sul-sul, reproduz as iniquidades que tenta combater. Um dos fatores relevantes que deve ser pensado é a noção de raça, elemento crucial para as novas estratégias de colonização que constituiu identidades opostas entre colonizadores e colonizados de maneira excludente. O colonizador é caracterizado por valores superiores como civilidade, desenvolvimento e progresso, e o colonizado como ignorância, pobreza e barbárie. “Os grandes escândalos da ética em pesquisa como, por exemplo, os ensaios clínicos para anti-retrovirais na África tiveram o envolvimento de raça”, apontou.
O pesquisador acredita que o Brasil precisa escutar o país de cooperação e não decidir pelo que acha ser melhor para aquela nação. “É responsabilidade do Estado Brasileiro promover espaços públicos bilaterais de discussão, e identificar as demandas para planejar e executar a cooperação em saúde de forma equilibrada”, finalizou.