Inovações Digitais em Saúde

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  • 8 de Agosto de 2022
Direitos humanos e normas legais devem ser garantidos no Sistema Único de Saúde (SUS)

Uma metodologia de análise e acompanhamento no desenvolvimento de protótipos de tecnologia digital para os serviços de saúde encontra-se em fase avançada de elaboração pela Fiocruz Brasília, mediante acordo de cooperação com a Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES/DF). Foram selecionadas oito propostas inovadoras que visam automatizar cadastros, unificar sistemas, integrar dados e facilitar a comunicação entre usuários e profissionais, no âmbito da atenção primária do SUS/DF.

O processo seletivo foi realizado conforme protocolo constante em edital público, como parte do projeto “Saúde digital para o enfrentamento da Covid-19 nos territórios do Distrito Federal”, sob responsabilidade do Colaboratório de Ciência, Tecnologia e Sociedade da Fiocruz Brasília; da Fundação de Apoio à Fiocruz (Fiotec); da Coordenação de Atenção Primária à Saúde (CoAPS) da SES-DF; e da Universidade de Brasília (UnB). A efetivação do projeto conta com o patrocínio da Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAP-DF) e com o apoio da Plataforma de Inteligência Cooperativa com Atenção Primária à Saúde (Picaps) e do Impact Hub Brasília.

O Núcleo de Estudos sobre Bioética e Diplomacia em Saúde (Nethis) da Fiocruz Brasília está a cargo da elaboração de um guia de orientação e subsídios aos autores dos protótipos e aos gestores de saúde. A intenção é que o desenvolvimento e a adoção dessas inovações não acentuem desigualdades, mas sim ampliem o acesso universal e equânime aos beneficiários da atenção primária do SUS no DF.

Trate-se de uma medida na linha de precaução alertada há cinco séculos por Paracelso, médico visionário que antecipou diversas inovações confirmadas na era moderna, ao dizer que tudo que faz bem, também faz mal.

São inegáveis as vantagens da adoção de soluções digitais na atenção e na vigilância em saúde, bem como na gestão de todos esses serviços, em termos de eficácia, eficiência e redução de custos. Contudo, está comprovado que o estoque e o manuseio de grandes volumes de dados biológicos e de enfermidades da população correm o risco, na contramão de seus usos virtuosos, no sentido de facilitar e até ampliar resultados indesejáveis, imprevistos e até incontroláveis no tocante aos interesses e aos direitos das pessoas e das coletividades.

A constituição de grandes bases de dados se tornou valiosa para a saúde pública, na trilha histórica de um processo de desenvolvimento científico e inovações que se acelera progressivamente desde meados do século passado. Sob a designação hoje usual de lagos de dados de saúde, representam recursos promissores para a construção do futuro da humanidade; e, ao mesmo tempo, constituem uma fonte de poder expressivo na condução dos negócios de poderosas organizações do complexo econômico e industrial desse setor. É portanto, razoável admitir que a resultante dessa tendência, mantido o atual modelo de desenvolvimento global, será o agravamento e ampliação das desigualdades em saúde.

A integração e análise de grandes bases de dados de saúde já é palavra de ordem nos sistemas e serviços de saúde em todos os países. Caso esse fantástico acervo de valores permaneça, dominantemente, sob controle de empresas privadas, livres da vigilância do poder público e, portanto, do conhecimento dos indivíduos de grupos sociais, as desigualdades já presentes nesse campo tendem a se ampliar e aprofundar.

Por essa razão, é imperioso que o avanço da transformação digital da saúde no Brasil esteja subordinada ao controle do poder público, no seu papel de fiel cumpridor dos interesses da sociedade, segundo os princípios de universalidade e equidade prescritos para o SUS pela Constituição Nacional. A iniciativa da Fiocruz Brasília é oportuna e acertada ante o dinamismo dessas inovações, pois é indispensável que as instituições públicas de ensino e pesquisa no Brasil assumam o protagonismo que lhes cabe na regulação desses processos.

A metodologia especifica um conjunto de critérios balizadores para o desenvolvimento de tecnologias digitais nos serviços de saúde, a serem compartilhados com os autores dos protótipos, mediante encontros pedagógicos durante essa fase e, a seguir, como subsídios para os gestores durante o processo de incorporação. A intenção, a depender dos resultados obtidos no DF, é ampliar experiências dessa natureza com gestores do SUS, em colaboração com as instituições de ensino e pesquisas nos diversos contextos nacionais.

A elaboração do guia metodológico a cargo Nethis/Fiocruz se inclui no componente programático sobre inteligência artificial no contexto do desenvolvimento e das desigualdades, linha de trabalho mais recente adotada pelo Núcleo, com apoio dos consultores sênior: Felix Rigoli, do Centro de Estudos e Pesquisas em Direito Sanitário da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (Cepedisa/FSP/USP); e Natan Monsores, do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília (FS/UnB).